Metaverso: a revolução do mundo que conhecemos
Como o Metaverso irá mudar nossa “existência”?
Para Platão o mundo em que vivemos, o qual consideramos como “nossa realidade” ou a forma como existimos não passa de sombras, reflexos de um mundo ideal e perfeito o qual não podemos atingir.
Um filme projetado em uma tela branca é real ou apenas os momentos em que os atores fizeram as ações que foram filmadas é a realidade, ainda que passada?
E as emoções e por que não, as sensações, geradas por um jogo de computador são reais?
Perceba que cada vez mais os limites entre o real, leia-se mundo material ou 3D, e o virtual – 5D, se estreitam e dissipam, de modo que para entender o impacto que o metaverso terá em nossa vida precisamos nos despir de todas as ideias e limitações dentro das quais temos vivido.
Por outro lado, basta fazermos uma breve reflexão e veremos que já vivemos muito mais no mundo virtual que no dito mundo real, por exemplo, se desejamos pedir comida, procurar um imóvel para alugar, verificar a grade de exibições no cinema ou no teatro, fazer um pagamento e até mesmo buscar por um médico especialista vamos direto ao aplicativo, ao site ou ao deus Google ao invés de sair batendo de porta em porta.
Isso porque no momento, é o que podemos fazer com a tecnologia disponível, entretanto se meu médico, por meio de uma consulta com ferramentas e dispositivos de exames de imagem e fisiológicos pudesse detectar uma pneumonia, isso não seria fantástico? Imagine o ganho de tempo e eficiência.
Assim o metaverso depende antes de tudo da disponibilização de tecnologias e equipamentos da mesma forma que as lâmpadas de Thomas Edison precisaram de estações de eletricidade que pudessem gerar energia suficiente para acender as lâmpadas das cidades e das casas.
Nesse sentido não podemos dizer quando isso ocorrerá, mas temos certeza que não tardará, enquanto isso podemos elucubrar sobre seu impacto em nossas vidas.
Existência Metaversial[1]
A era digital possibilitou avanços em muitas áreas da nossa vida, acesso à informação, diminuição das distâncias, mais conforto e praticidade ao mesmo tempo que trouxe novos problemas como longas jornadas de trabalho, maior controle, desinformação, automatização e manipulação das nossas escolhas por meio de algoritmos, falhas na proteção dos nossos dados pessoais, de saúde e financeiros, insegurança e incertezas.
Ainda que todos esses avanços e problemas tenham sido possibilitados ou causados pela tecnologia todos eles têm sua raiz na existência humana e na forma de sociedade que criamos, vivemos e que se transformará.
Se retrocedermos apenas três séculos, quando se deu a primeira Revolução Industrial com o advento da máquina a vapor, a linha de produção para viabilizar a produção em grande escala, a nova relação trabalho x capital e suas consequências vemos que a sociedade se reinventou e do mesmo modo essa mudança trouxe uma mudança na nossa forma de viver – existir.
Assim a existência no metaverso transcende a ideia de que o trabalho, o lazer, os pagamentos e os relacionamentos irão acontecer no mundo virtual ou online por meio de plataformas como Microsoft Teams ou Google Meetings, Roblox, Minercraft, Instagram ou TikTok elas existirão online.
Vejamos um exemplo, hoje podemos adquirir um par de tênis acessando diretamente o ecommerce da marca de minha preferência, fazer o pagamento com um cartão de crédito ou qualquer outra transação bancária e receber o produto no dia seguinte. O ato da compra “aconteceu” on line mas ele “existe” fora da realidade virtual e o seu resultado é a transação com a transferência de um valor em moeda e o recebimento de um produto, nesse caso tangível.
Entretanto, caso decidamos comprar uma skin para ser usada em um avatar durante um show no metaverso e fizermos o pagamento com bitcoins por meio de uma wallet, tanto o avatar com a skin, quanto o show e a transferência só existirão no metaverso ainda que o valor em bitcoins tenha tido sua origem numa operação de compra de bitcoins por meio de moeda corrente.
Isso significa dizer que num primeiro momento viveremos em realidades paralelas até que elas se fundam entretanto, essa nova existência deverá refletir a sociedade na qual vivemos hoje, seus valores e crenças, suas lutas e agruras por que isso é inerente ao ser humano e independe do local ou forma como ele se manifesta.
Se o metaverso nos proporcionará uma outra forma de existir, e lembrando que continuaremos a ser seres humanos, talvez essa nova existência não seja, no fundo, tão diferente da que já experienciamos, por exemplo, como lidaremos com a questão da identidade no mundo virtual tendo em vista que hoje a sociedade se relaciona e conflita com questões de gênero, raça e etnia além de questões culturais como vestimenta, cabelo e maquiagem as quais remetem a valores ancestrais. Qual será o impacto de um avatar de um homem caucasiano se apresentar como um aborígene ou negro ou vice-versa?
Questões identitárias já foram identificas na criação da coleção dos NFts Cryptopunks criados na plataforma da Ethereum com base em fotos de perfis de várias redes sociais e que num dado momento os Cryptopunks mais baratos foram aqueles que tinham a cor de pele mais escura, como a cor de pele negra.
Há quem reporte a questão da oferta e da demanda e que haveria maior oferta de Cryptopunks de pigmentação mais escura que os de pigmentação de pele clara, outros que os indivíduos caucasianos, não investiriam em um avatar que não refletisse a sua própria identidade ou ainda que se desassociasse muita desta e, novamente, essas são questões sociais e não tecnológicas, da mesma forma que a indústria de brinquedos oferece hoje bonecas que refletem as diferentes raças existentes no planeta.
Será que a existência metaversial será mais confortável para aqueles que se enquadrarem dentro dos padrões de beleza e sucesso da sociedade orgânica (material) que conhecemos ou esses padrões serão diferentes no mundo virtual? Se considerarmos o caso dos Cryptopunks “moreninhos” nos parece que não.
Assim, o realismo do avatar ou a sua identidade com o ser humano que o detém importa? Do mesmo modo importará se essa existência é virtual ou orgânica (material)?
Será que a possibilidade de nos enxergar em bites nos fará ver a nossa essência comum nas moléculas de carbono até o entendimento de que tudo é exatamente a mesma coisa não importando onde ou como se manifeste?
Por enquanto não há como responder a tais questionamentos, mas podemos tentar nos preparar, com a mente muito aberta e nos afastando dos pré-conceitos, para lidar com eles.
Lilian Pinheiro
06 nov 2022
[1] BALL, Matthew. The metaverse and how it will revolutionize everything. Liveright Publishing Corporation. New York. 2022. p. 290.